quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Gisele Bündchen: a mulher-objeto e a limitada formação crítica dos brasileiros



A campanha da Hope (marca de lingerie),  estrelada pela Top Model  Gisele Bündchen,  tem sido alvo de diversos protestos. Não sem razão,  já que os comerciais reproduzem antigos estereótipos que pessoas mais esclarecidas, independente de gênero, lutam há tempos para derrubar.  Neles, a mulher brasileira é apresentada como um ser dotado de natural sensualidade e é incentivada a utilizar essa arma para resolver situações problemáticas com o esposo.
Qualquer pessoa que tenha senso crítico um pouco mais aguçado poderá perceber que, do início ao fim, os comerciais reforçam a ideia de que  a mulher não é só sensual, ela é também péssima motorista, financeiramente dependente do marido e limitada na sua capacidade argumentativa, daí basta tirar a roupa e todos seus problemas serão resolvidos.  Mais uma vez, a brasileira, especificamente,  é revestida de uma imagem altamente sexualizada.
Não sou da patrulha do politicamente correto, penso até que existe um certo exagero,  também não sou feminista militante. As causas que me movem são aquelas em favor da dignidade humana, portanto, sempre me colocarei em defesa dos grupos que sofrem qualquer tipo de opressão.  Por isso, me senti impelida a escrever este post, sobretudo depois de ler comentários de leitores no UOL sobre a notícia de que o governo pediu a suspensão das propagandas.
A maioria absoluta se posicionou contra o governo e a favor de que os comerciais continuem sendo veiculados. Todos têm direito de manifestar suas opiniões e devem ser respeitados, no entanto,  é difícil não ficar frustrada diante dos argumentos usados. Entre os mais  recorrentes está dizer que as mulheres que protestam são feias, invejosas, encalhadas, mal-amadas e uma série de outros adjetivos semelhantes. Diante de argumentos tão boçais que põem em evidência o atraso intelectual do povo brasileiro,  é difícil, como educadora, não ficar frustrada.  Mais grave ainda é ver que as mulheres, de modo geral, aprovam a campanha por achar que se trata de elogio, não conseguem perceber a  discriminação e o sexismo explícitos, sim, porque o que passam não é uma mensagem tácita ou subliminar.  
A conclusão que podemos tirar disso é que o Brasil ainda não conseguiu oferecer formação suficiente para que as pessoas desenvolvam algum nível de  capacidade crítico-reflexiva.  Só depois que os indivíduos estiverem devidamente esclarecidos é que podem escolher, com mais legitimidade, como vão se posicionar.  No caso das mulheres, particularmente,  elas podem até optar por serem tratadas como objetos, mas não sem antes saber que há outras escolhas possíveis. 

5 comentários:

Luciene Albernaz disse...

Muito interessante e complexo esse assunto que você abordou mas tudo isso ainda se complica muito porque os Brasileiros, tudo o que fazem liga as mulheres boas, bonitas e sensuais, qualquer propaganda brasileira tem que ter uma mulher bonita e sensual.... parabéns!

thais beltrame disse...

Um alívio ler o seu comentário, de verdade. Fui uma das achincalhadas porque comentei na página do Jornal Folha, chingada de "bagulho" pra baixo. É triste ver que ao contrário desta situação gerar um debate saudável de como devemos repensar a perpetuação de certos estereótipos pela mídia brasileira e a nocividade disto, vira um jocoso bate-boca digno de boteco. Não ocorre a nenhuma destas pessoas (homens e mulheres, o que é pior) a ligação entre a objetificação da mulher e o gravíssimo problema que temos da violência contra a mesma. Lamentável mesmo.

Branquinha disse...

É a regra nesse país. Defendem o Bruno porque a Elisa Samúdio era uma vadia, consomem "mulheres frutas" que se orgulham de serem reconhecidas exclusivamente pelos seus corpos, assim como aprovam e aplaudem os estereótipos estrelados pela Gisele Bündchen que vez ou outra se envolve em campanhas ou assuntos delicados (vide uso de peles e comentários sobre aborto). Esse é o país que se proclama democrático e se orgulha da sua constituição cidadão, mas ainda bem carentes de cidadãos livres e conscientes. Falta-nos respeito à dignidade das pessoas, e essas propagandas reforçam os estereótipos. Parabéns pelo texto!

Juan Rossi disse...

Sabia da tal propaganda, mas não a conhecia ainda. Fiquei chocadíssimo com a mesma e mais ainda com as opiniões que vocês citaram.
Percebam, sou apenas um bom músico que mal consegue ler livros e considera vocês que escrevem aqui cheíssimas de cultura e ideias altamente intelectuais.
Mas, e destaco o "mas", no pesar de meus limites, sou ainda ser humano masculino e sei que, introjetadíssima em mim, persiste e existe a saga terrível da consideração à minha metade feminina - e às mulheres em geral - como que engarrafadas em sua própria condição histórica de submissão a dogmas ditos masculinos.
Isto é, esta metade do mundo convive aprisionada em estigmas alienantes, seja no oriente, com sua condição subalterna ao extremo, seja no ocidente, com um dilema mais crucial que por lá, o de serem estas mulheres somente dignas de alguma existência se, e somente se, houver sua adesão de corpo e alma às piadas, programas televisivos, novelas, revistas e propaganda de todo teor de extremo baixo calão e, acima de tudo, ofensivas no que há de mais pujança nesta metade de mundo, na sua dignidade/identidade.
É-nos, portanto, mister, urgentíssimo, calar estas vozes tonitruantes que fazem até nos sangrar ao sermos educados em nossas infâncias com tais conceitos!
Lutemos contra isso, para resgatarmos a elas - mulheres - e a nós, homens, desta opressão torturante. Não às propagandas que se vendem por imagens que já conhecemos. Ótimo, há abertura ao diverso como etnia, que também haja abertura à diversa em seu gênero!! E tenho dito.

Janete Rodrigues disse...

Tem razão Luciene, na propaganda brasileira, a mulher é um produto que ajuda a vender outros produtos. Thaís, infelizmente, a maioria não consegue perceber que a violência contra mulher está intimamente relacionada com sua "objetificação". De qualquer modo, é sempre bom notar, através dos comentários que recebo aqui, que existem pessoas que conseguem ver mais além. Branquinha, vamos acreditar que estamos num processo, ainda chegaremos nesse estágio onde todos serão tratados com dignidade e respeito. Juan, foi modesto ao dizer que é "mal consegue ler livros". Seu comentário revela uma capacidade crítico-reflexiva que poucos possuem. Agradeço muito a visita e contribuição de todos vocês.

Abs,

Janete