Imagem: http://eucomaarte.blogspot.com.br/
A etnometodologia surgiu na Califórnia nos
anos 60, ganhou terreno nos Estados Unidos e chegou até a Europa. Sua
importância epistemológica deve-se ao
fato de ter promovido uma ruptura radical com os modos de pensamento da sociologia tradicional. O eixo da pesquisa etnometodológica
é a idéia de Shültz, segundo a qual,
todos são sociólogos em estado prático. Nesse sentido, as pessoas
descrevem sua realidade.
Harold
Garfinkel é apontado como o grande fundador da etonometodologia. Seu trabalho
recebeu influência de Tallcot Parsons e sua teoria da ação. Contudo, a invés de
priorizar as regras e os aspectos cullturais determinando a ação, propõe que a relação entre ator e situação deriva de processos de interpretação.
Assim vemos a sociologia passando de um paradigma normativo para um paradigma
interpretativo.
O
interacionismo simbólico é também uma das fontes da etonometodologia, em
particular com sua teoria da atribuição de rótulos, labeling theory. Ao tratar da questão dos desvios, os etonometólogos
recorrem a essa teoria para considerarem os efeitos de uma construção social.
Ao serem rotulados de desviantes, tais
pessoas assumem esse rótulo e desse modo justificam comportamentos posteriores
à atribuição dos rótulos.
Os conceitos chaves da abordagem etnometodológica são:
prática, realização, indicialidade,
reflexividade, accountability
e a noção de membro. Garfinkel explica
que seus estudos abordam atividades práticas, circunstâncias práticas e o
raciocínio sociológico prático. Assim, a etnometodologia é a pesquisa empírica
dos métodos que os indivíduos lançam mão para atribuir sentido e ao mesmo tempo
realizar as suas ações cotidianas.As crenças e os comportamentos de senso comum
são interpretados como constituintes necessários de todo comportamento
socialmente organizado. No que se refere
ao conceito de realização, o que a sociologia tradicional chama de “modelos” é
considerado pela etnometodogia como “as realizações contínuas dos atores”. Os seus defensores argumentam
que, mesmo quando os fatos se contradizem, os sociólogos arrumam um jeito para
encontrar explicações que conformem a suas hipóteses preestabelecidas, especialmente, a prerrogativa de “constância do objeto”. Para evitar tal artimanha teórica, os
etnometodólogos privilegiam a noção de processo, que busca no dinamismo do mundo social suas evidências, em detrimento da elaboração de
hipóteses que pressupõe um conhecimento prévio que não considera as contínuas transformações da realidade a ser pesquisada.
A indicialidade é outro conceito relevante e
parte da premissa de que é através da linguagem que a vida social é
constituída. Nas relações do dia a dia, as pessoas conversam, indagam,
respondem, descrevem, ensinam, trapaceiam. Pode-se definir como indicialidade todas
as determinações que se ligam a uma palavra, a uma situação. Esse conceito é um
termo técnico, adaptado da lingüística. De acordo com essa proposição da
etnometodologia, as palavras só ganham sentido completo no seu contexto de
produção, quando são “indexadas” a uma situação de intercâmbio lingüístico. Mas
a indexação não esgota a integralidade do seu sentido.
A
etnometodologia também utiliza o conceito de reflexividade em suas análises.
Tal conceito designa as práticas que, concomitantemente, descrevem e constituem
o quadro social. É, segundo Coulon, a propriedade das atividades que pressupõe
ao mesmo tempo que torna observável a mesma coisa. A Accountability possui duas
características importantes: reflexividade e racionalidade. Os etnometodólogos procuram
definir e teorizar a accountability,
propondo que os accounts são
informantes ou estruturantes da situação de enunciação. Afirmar que o mundo
social é accountable é dizer que ele
é algo disponível, isto é, descritível, inteligível, relatável, analisável.
A
noção de membro é outra terminologia chave da abordagem etnometodológica. Tornar-se
membro significa filiar-se a um grupo, a uma instituição, o que exige uma
conformidade com a linguagem institucional comum. Essa filiação repousa sobre a
singularidade de cada um. Uma vez ligados à coletividade, os membros não têm
necessidade de se interrogar sobre o que fazem. Conhecem as regras implícitas
de seus comportamentos e aceitam as rotinas inscritas nas práticas sociais.
Dessa forma, o membro não é apenas uma pessoa que respira e pensa, mas alguém
dotado de um conjunto de modos de agir, métodos, de atividades, de savoir-faire, que a capacita para criar
dispositivos de adaptação para dar sentido ao mundo que a cerca.
Por causa
de seu caráter radical, a etnometodologia atraiu a hostilidade da sociologia
estabelecida. Em 1968, com a publicação da recensão que J.S. Coleman consagrou
na American Sociological Review aos Studies de Garfinkel, estourou a guerra
entre uma posição mais clássica da sociologia e a proposta etnometodológica que
não considera o senso comum como elemento residual, mas como algo
imprescindível para a compreensão de como os atores interpretam a vida social.
________________________
COULON, Alan. Etnometodologia. Petrópolis: Vozes, 1995.