sexta-feira, 22 de julho de 2011

Sobre a metrópole e suas consequências para a vida mental em Georg Simmel



Segundo Simmel, as maiores dificuldades da vida moderna resultam das tensões existentes entre o  indivíduo, com sua vontade de  autonomia e emancipação,  e a força dos poderes supremos da sociedade com suas instituições, cuja função primordial é fornecer os padrões sócio-culturais que devem ser compartilhados por todos.  Nesse processo de luta pela liberdade, os acontecimentos do século XVIII tiveram um papel significativo, especialmente com a difusão dos valores iluministas. No século XIX, ocorreu outra importante mudança, pois,  além da liberdade do homem, houve uma promoção  da sua  individualidade, possibilitada pela intensificação da divisão do trabalho. Assim, estabeleceu-se uma ambiguidade: se por um lado a especialização fez com que o indivíduo se tornasse único e indispensável, por outro, o transformou em um sujeito que depende dos outros no cumprimento de seus respectivos papéis. 
A proposta de Simmel é tentar desvelar a forma como o indivíduo responde  diante do excesso de estímulos nervosos que recebe vivendo nesse mundo complexo, caracterizado por um dinamismo sem precedentes. Mais especificamente, o autor está interessado em compreender as defesas psicológicas que o  habitante da metrópole desenvolve para  lidar com os desafios de se viver numa grande cidade.  Uma assumida tendência à  intelectualização  e a  atitude blasé  definem a postura típica que o sujeito  assume como forma de reação perante os estímulos excessivos. Ao anunciar o domínio do intelecto na condução das relações humanas, Simmel aponta como principal prejuízo o distanciamento afetivo com o propósito  de preservar a sanidade psíquica.  O uso do dinheiro, elemento neutro, seria uma evidência desse distanciamento. Nesse sentido, as relações de troca, também acentuadas com a divisão do trabalho, prescindiriam das relações pessoais mais próximas, já que a mediação é feita por meio da moeda corrente. O mercado, portanto, apresenta-se como o lugar, por excelência,  das relações no mundo moderno.  O comportamento  blasé, resultante do mesmo processo,  caracterizaria a postura de indiferença do indivíduo frente aos inúmeros acontecimentos cotidianos. A recorrência desses acontecimentos torna-os banais, ou seja,  os indivíduos deixam de reagir a eles. Nesse contexto,  o sujeito perde sua capacidade de distinção entre as coisas que, em consequência, deixam de ser percebidas como significantes.
Além dos traços, acima descritos, vale ressaltar,  ainda,  que a vida mental desse indivíduo citadino caracteriza-se, também, por uma atitude de reserva que se manifesta por meio de um código tácito que impede que os limites da convivência sejam ultrapassados. Dessa maneira, evita-se os contatos indesejados assumindo uma atitude que pode ser interpretada como frieza.  Em última instância, a reserva pode vir à tona como repulsa mútua e/ou sentimento de ódio, produzindo, por conseguinte, conflitos.
Em síntese,  a vida na metrópole condicionaria a emergência de relações sociais marcadas pela indiferença, pela impessoalidade, pelo cálculo e por uma extrema individualização dos sujeitos. Simmel conclui falando sobre as inúmeras possibilidades da vida metropolitana, com toda  sua riqueza cultural e fertilidade de significados. Na metrópole, o indivíduo pode se ver livre  das amarras a que estão sujeitas as pessoas que vivem em pequenas comunidades.  Não obstante,  essa liberdade pode assumir a forma de solidão e anonimato.
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SIMMEL, Georg. A metrópole e a vida mental. In: VELHO, Otávio Guilherme (org.). fenômeno urbano. 4ª ed. Rio de Janeiro, Ed. Guanabara, 1987.